O Efeito Cantillon: Por Que a Inflação Não Afeta Todos da Mesma Forma? 255p6i
A inflação é um fenômeno econômico que, em teoria, deveria afetar toda a economia de forma proporcional. No entanto, a realidade é bem diferente: enquanto alguns setores e grupos sociais se beneficiam da expansão monetária, outros sofrem com a perda de poder de compra. Esse fenômeno foi descrito pelo economista irlandês Richard Cantillon no século XVIII e ficou conhecido como Efeito Cantillon.
De forma simplificada, Cantillon demonstrou que o impacto da expansão monetária não ocorre de maneira uniforme. O dinheiro novo entra na economia em pontos específicos e beneficia primeiro aqueles que o recebem antes que a inflação se manifeste. Com o tempo, à medida que esse novo dinheiro se espalha pelo sistema, os preços começam a subir, e aqueles que recebem por último sofrem as consequências da desvalorização da moeda.
A lógica é simples: quem recebe o dinheiro novo primeiro pode gastá-lo antes que os preços subam; quem recebe por último paga mais caro por tudo sem ter tido um aumento proporcional em sua renda. Esse mecanismo gera uma redistribuição de riqueza silenciosa, que muitas vezes a despercebida pelo público e pelos formuladores de políticas econômicas.
Como o Efeito Cantillon Funciona na Prática?
Para entender melhor esse fenômeno, imagine que o Banco Central decida expandir a base monetária para estimular a economia. Esse dinheiro novo não é distribuído diretamente para todas as pessoas igualmente. Ele entra na economia de forma seletiva, geralmente através de empréstimos para bancos, grandes empresas e investidores institucionais.
Esses primeiros receptores do dinheiro têm uma vantagem: eles podem comprar ativos financeiros, imóveis e bens de capital antes que a inflação seja sentida pelo resto da população. Conforme o dinheiro circula na economia e atinge os trabalhadores e consumidores comuns, os preços já subiram e o poder de compra da moeda já foi corroído.
Na prática, o Efeito Cantillon beneficia os mais próximos da criação de dinheiro (bancos, grandes empresas e investidores) e prejudica aqueles que recebem o dinheiro mais tarde (trabalhadores, aposentados e a classe média).
Exemplos Práticos do Efeito Cantillon
O Efeito Cantillon pode ser observado em diversas situações do mundo real. Abaixo, listamos alguns exemplos marcantes:
- Crises Financeiras e Resgates Bancários
Durante a crise financeira de 2008, governos e bancos centrais injetaram trilhões de dólares no sistema financeiro para salvar bancos e grandes empresas. Esse dinheiro novo entrou no topo da economia, beneficiando o setor financeiro e os mercados de capitais. Enquanto isso, trabalhadores perderam empregos, viram seus salários desvalorizados e enfrentaram uma inflação crescente no custo de vida. - Expansão Monetária e Mercado Imobiliário
Nos últimos anos, bancos centrais ao redor do mundo mantiveram políticas de juros baixos e injeção de liquidez, o que incentivou a compra de imóveis por grandes fundos de investimento. Isso elevou os preços das moradias, tornando a compra de um imóvel mais difícil para a classe média. Enquanto os grandes investidores lucraram com a valorização, os trabalhadores viram o sonho da casa própria se tornar mais distante. - Aumento dos Preços de Commodities
Em economias emergentes, a expansão monetária muitas vezes causa inflação em alimentos e energia antes que os salários sejam ajustados. Isso ocorre porque o dinheiro novo primeiro é utilizado para investimentos e especulação, elevando o custo de insumos básicos. No Brasil, por exemplo, a alta dos preços dos alimentos e combustíveis entre 2020 e 2022 impactou fortemente a população de baixa renda, que viu seus gastos essenciais aumentarem sem uma compensação equivalente em seus rendimentos. - Setor Tecnológico e a Bolha de Liquidez
Nos últimos anos, a política de juros baixos facilitou a captação de recursos por startups e grandes empresas de tecnologia, que tiveram o a bilhões de dólares em investimentos baratos. Enquanto isso, trabalhadores desses setores aram a enfrentar cortes de empregos à medida que as condições financeiras se tornaram mais apertadas, mostrando como o dinheiro barato inicialmente beneficia apenas alguns antes de gerar desequilíbrios na economia.
O Efeito Cantillon no Brasil
O Brasil tem uma longa história de políticas monetárias expansionistas e seus impactos desiguais na sociedade. Durante a pandemia, o governo e o Banco Central adotaram políticas para injetar dinheiro na economia e manter o crédito barato. No curto prazo, isso ajudou a evitar uma recessão mais profunda. No entanto, essa liquidez rapidamente inflacionou ativos financeiros e imóveis, beneficiando investidores e grandes empresas.
Por outro lado, a classe média e os trabalhadores viram os preços de bens essenciais dispararem, especialmente alimentos, combustíveis e aluguel. O aumento da inflação corroeu o poder de compra da população, evidenciando mais uma vez que a criação de dinheiro beneficia uns antes de prejudicar outros.
As Lições do Efeito Cantillon
O Efeito Cantillon é uma realidade em qualquer sistema onde há emissão de moeda e expansão do crédito. Ele demonstra que a política monetária não é neutra: quem está mais próximo da fonte de dinheiro se beneficia, enquanto os mais distantes sofrem as consequências da inflação.
Para investidores, compreender esse fenômeno é essencial para proteger seu patrimônio. Em períodos de política monetária expansionista, ativos escassos como ouro, imóveis e ações costumam ser refúgios contra a perda de valor da moeda. Já para a população em geral, a lição é clara: quando há expansão monetária, é preciso estar atento, pois quem recebe o dinheiro novo por último sempre paga a conta.
Em tempos de impressão de dinheiro e estímulos econômicos, é fundamental entender que a inflação não é apenas um número no boletim do IBGE, mas um mecanismo de redistribuição de riqueza muitas vezes invisível para a maioria da população.
Mateus H. ero
Assessor de investimentos
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